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    Que se passa na casa do lado?

    Que se passa na casa do lado?

    4/12/2022

    Este mês tem sido diferente dos outros. Faço anos no dia 1, pedi que me dessem de presente um cão, o meu pai recusou. Não me serviu de nada insistir porque repetia sempre o mesmo:

    - Os cães precisam de espaço, não são felizes num andar.

    Ainda tentei convencê-lo lembrando:

    - Há pessoas que vivem em apartamentos e têm cães.

    - E também têm tempo para os levar à rua e nós não temos. Eu e a mãe chegamos tarde, tu estás inscrito em muitas atividades, não dá. Escolhe outra prenda.

    Fiquei um bocadinho triste, mas paciência.

    Na semana seguinte, parou à porta do prédio uma carrinha de mudanças. Eu estava a chegar, fiquei a ver os empregados levarem móveis e pacotes de todos os tamanhos para o 2º direito, que ficou vazio há algum tempo.

    Como vivo no 2º esquerdo, pensei logo que se os novos vizinhos tivessem filhos da minha idade era ótimo. Mas durante alguns dias só me cruzei com um homem novo. Subimos juntos no elevador, nunca foi possível meter conversa porque o telemóvel dele toca constantemente, ele atende e pronto, conversa adiada.

    O meu quarto fica no extremo da casa, do outro lado da parede já é a casa dele.

    Pois de manhã muito cedo, que alegria! Ouvi ladrar. Fiz imensos planos para travar amizade com o novo vizinho e tencionava oferecer-me para passear o cão. O problema é que durante vários dias não vi o vizinho, nem o cão. Continuava a ouvi-lo ladrar de manhã, o que me intrigava ao máximo. Por que raio só ladrava àquela hora? E como se aguentaria sem ir à rua? Ou levavam-no a passear a meio da noite?

    De ouvido à escuta, esperava que desse sinal de si e, de manhãzinha, lá estava ele a ladrar, por pouco tempo e sempre da mesma maneira. Comecei a pensar como seria e imaginei um cachorro gorducho, de orelhas compridas e olhar bondoso. Já o considerava um amigo, quando finalmente encontrei o vizinho no patamar. Apresentei-me.

    - Sou o Manel e vivo na porta do lado.

    - Eu sei - respondeu amavelmente.

    - Se algum dia não tiver tempo ou estiver cansado, posso passear o seu cão.

    Ele sorriu, deu-me um piparote no nariz e abanou a cabeça.

    - Não tenho cão nenhum, filho.

    - Não? Mas eu ouço ladrar todas as manhãs.

    O sorriso alargou-se.

    - É natural. Porque foi esse o toque que escolhi para um velho telemóvel que me serve de despertador. Adoro cães, sabes? E até comprei um cachorro muito engraçado, de pelo preto, com manchas brancas. As orelhas dele são compridas e o olhar tão meigo que não mete medo a ninguém. Está em casa da minha irmã que tem jardim.

    Arregalei-me de espanto, pois acertara em tudo, menos na cor. Aliás, pensando bem, acho que o tinha imaginado preto, só falhei nas manchas brancas. Vendo-me apalermado, o vizinho prometeu:

    - Um dia destes trago-o cá e se quiseres podes levá-lo à rua.

    Espero que tenha percebido que fiquei contentíssimo, porque só conseguiu gaguejar um agradecimento.

    Amanhã acaba o mês. Vamos ver que surpresas me traz o seguinte.


    Ana Maria Magalhães

    Isabel Alçada


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