Nunca esquecerei um texto sobre a importância de saber ler publicado, há anos, pela escritora norte-americana Katherine Paterson (quem não leu o emocionante romance “Lídia”, traduzido para Português por Isabel Ramalhete, veja pelo menos os belos filmes “Bridge to Terabithia” e “The Great Gilly Hopkins”, baseados em livros da autora e que já têm sido exibidos nas nossas televisões).

Nesse texto, Katherine Paterson lembrava o caso do escravo negro Frederick Douglass (1818-1895) que, na sua autobiografia, conta como se alfabetizou contra a vontade do seu senhor. Achava este que um escravo não deveria ser alfabetizado, uma vez que, sabendo ler, se tornaria exigente e perigoso: não quereria manter-se mais tempo em escravidão. Pois bem, Douglass aprendeu a ler e a escrever, libertou-se do seu jugo e veio a tornar-se abolicionista e reformador social, além de orador, escritor e homem de estado norte-americano.

Este é um exemplo apenas, mas um exemplo bem vivo, de como aprender a ler e a escrever – melhor ainda: aprender a ler bem e a bem escrever – constitui um passo essencial na emancipação de qualquer ser humano. Daí os esclavagistas, os ditadores e os políticos autoritários estarem pouco interessados na promoção da leitura – porque nada interessados estão na liberdade e na formação de cidadãos críticos, questionadores e sensíveis.

Em início de ano letivo, quando tantas crianças ficam a conhecer a luz das primeiras letras e dão os primeiros passos na leitura e na palavra escrita, importa valorizar esta etapa essencial. Como escreveu também Katherine Paterson (que ganhou o Prémio Hans Christian Andersen em 1998, e o Prémio Astrid Lindgren, em 2006), “ler pode ser um caminho para a liberdade ou uma chave para um jardim secreto, que, se for tratado, transformará toda uma vida.” É claro que cuidar desse jardim implica também poder aceder – na família e na escola, desde muito cedo e ao longo de toda a escolaridade – ao convívio permanente com a literatura: o conto, a narrativa infantil ilustrada, a poesia, o teatro, mais tarde a novela e o romance.

 

José António Gomes

Escola Superior de Educação do Porto (CIPEM | INET-md)

SOBRE o dia

Todos os anos a UNESCO celebra o Dia Internacional da Alfabetização para (re)lembrar o mundo sobre a importância da alfabetização como uma questão de dignidade e direitos humanos. Apesar dos progressos feitos ao longo dos anos, cerca de 773 milhões de adultos em todo o mundo ainda não dominam as competências básicas em escrita e leitura.

O Dia Internacional da Alfabetização de 2021 será celebrado com o tema “Alfabetização para uma recuperação centrada nas pessoas: construindo uma ponte sobre a exclusão digital”.

A crise causada pelo COVID-19 criou interrupções sem precedentes na aprendizagem de crianças, jovens e adultos. Também acentuou as desigualdades existentes no acesso a oportunidades significativas de alfabetização, afetando desproporcionalmente os milhões de jovens e adultos analfabetos. A alfabetização de jovens e adultos não foi levada em consideração por muitos planos de intervenção nacionais iniciais, embora os programas de alfabetização tivessem que suspender seu funcionamento normal.

Mesmo durante este período de crise global, foram feitos esforços para encontrar outros meios de garantir a continuidade pedagógica, em particular através do ensino à distância, que muitas vezes era ministrado em conjunto com a aprendizagem presencial, mas o acesso a oportunidades de alfabetização não. proporcionalmente. A velocidade com que passou para o E@d também expôs a exclusão digital que persiste em termos de conectividade, infraestrutura e capacidade de uso de tecnologia, bem como as desigualdades existentes em outros serviços, como o acesso à eletricidade.

No entanto, a pandemia lembrou o papel que a alfabetização desempenha: além de sua importância inerente como um elemento do direito à educação, a alfabetização permite que as pessoas se emancipem e melhorem suas vidas, proporcionando-lhes mais capacidades para escolher um estilo de vida que poderia ser mais. conveniente para eles. É também um fator de desenvolvimento sustentável. A alfabetização é parte integrante da aprendizagem ao longo da vida e da educação com base no humanismo, conforme descrito pelo Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 4 e, nesse sentido, é essencial para a recuperação centrada no ser humano após a crise do COVID-19.

O Dia Internacional da Alfabetização de 2021 examinará como a alfabetização pode ajudar a construir uma base sólida para uma recuperação baseada no ser humano, enfatizando as interações entre a alfabetização e as habilidades digitais necessárias para jovens e adultos analfabetos. Você também aproveitará os fatores que tornam a alfabetização baseada em tecnologias inclusivas e úteis, para que ninguém fique para trás. Desta forma, este Dia representa uma oportunidade para repensar o futuro do ensino e da aprendizagem no campo da alfabetização, no contexto da pandemia e no futuro.

Fonte: UNESCO