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Uma caixinha de sonhos
4/20/2023
Quando ofereço um livro a uma criança gosto de dizer: “Isto é uma caixinha de surpresas: quando se abre ou se fecha, o mundo fica diferente!”.
Sempre me lembro da magia de abrir esta caixa quando era criança: de encontrar e decifrar palavras que nunca tinha pronunciado, de ser levado a imaginar mundos estranhos e de partilhar os medos, alegrias, espantos e emoções com personagens que nunca tinha visto. Abrir um livro é passar uma fronteira que separa a terra que conhecemos das outras terras que as narrativas nos levam a visitar. E que bem que é feita esta passagem: não é de supetão, nem nos sentimos empurrados, somos antes convidados a passar da nossa realidade para outra de forma gentil, progressiva, para nos irmos aclimatando a novos ambientes e a novos protagonistas. E quando damos por ela… zás… já atravessámos a ponte, já lá estamos prontos a tomar como nossas as alegrias e as desventuras dos protagonistas.
Uma das grandes magias da leitura é a sua intimidade. Apesar do que está escrito no livro ser o mesmo para toda a gente, o que se lê tem um impacto único para cada um dos leitores. Os leitores criam as imagens, os tempos e os ambientes que, mesmo que estejam descritos, são bem diferentes para cada um de nós. É por isso que ler é um processo criativo: nenhum livro prescinde de ser imaginado e reescrito por quem o lê. E esta imaginação é tão forte que, mesmo que o livro tenha imagens, estas imagens são refeitas pelos leitores.
Abrir um livro é entrar numa floresta de imprevistos. Lembro-me quando, já com 11 ou 12 anos, de ler As aventuras de Tom Sawyer, de Mark Twain, ou Dois anos de férias, de Júlio Verne, com uma lanterna debaixo da roupa da cama. Mas porque seria? Não eram livros proibidos nem eu estava proibido de os ler... Penso hoje que fazia isto porque queria estreitar esta relação única, pessoal e não compartilhada com ninguém desta magia de imaginar o livro só para mim.
Neste Dia do Livro, quero celebrar tudo o que os livros nos dão. Os livros são como árvores: não se mudam à nossa vontade, não desaparecem quando queremos. Têm de ser procurados. Eles estão. Eles são. Como árvores:
Árvores:
Nunca fogem ou se escondem.
Só esperam o nosso olhar.
Livros: uma caixinha para acolher os nossos sonhos.
Por David Rodrigues
É Professor aposentado da Universidade de Lisboa, dirige a revista “Educação Inclusiva” da ONG Pró-Inclusão de que é presidente e fundador. Trabalhou em projetos internacionais para a UNESCO, UNICEF e Handicap Internacional sobre temáticas de Direitos Humanos, Equidade e Inclusão Social e Educativa. Em 2017 recebeu a distinção “Distinguished International Leadership Award” pelo Council for Exceptional Children – DISES (EUA).