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A Educação de Segunda Oportunidade
10/1/2019
A escolaridade constitui-se como um dos pilares fundamentais da preparação dos cidadãos para a vida adulta em todo o mundo e, considerando a atual ênfase político-social em torno das qualificações académicas como o principal caminho para o crescimento económico, emprego e plena inclusão social, o insucesso académico e o abandono escolar precoce constituem-se fragilidades importantes, com impacto negativo no desenvolvimento integral e bem-estar dos jovens e suas famílias, perpetuando em muitos casos ciclos intergeracionais de pobreza e exclusão social.
A escola representa um importante espaço social, não só pelas aprendizagens formais que garante aos seus alunos (ex.: leitura, escrita e aritmética), mas também pelo nível mais tácito de aprendizagens informais que proporciona (ex.: relações interpessoais com pares e relações interpessoais hierárquicas, resolução de conflitos, cumprimento de regras estabelecidas em contexto escolar), constituindo-se um pré-requisito ao nível do bem-estar, assim como um promotor determinante do desenvolvimento cognitivo e social de qualquer ser humano. Todavia, e não obstante a multiplicidade de razões que fazem da escola um contexto de desenvolvimento essencial, esta enfrenta, não raras vezes, o fracasso do seu próprio modelo, que se traduz em insucesso e, no pior dos cenários, em absentismo e/ou abandono escolar. As perspetivas tradicionais tendem a concentrar-se nas incapacidades dos alunos para explicar o seu fracasso académico e consequente abandono escolar precoce. No entanto, as políticas educativas e normas escolares também devem ser questionadas no que diz respeito à sua capacidade de garantir a educação como um direito universal e uma pré-condição para a cidadania e inclusão social de todos.
A Educação de Segunda Oportunidade, enquanto resposta de compensação específica destinada a jovens que tiveram uma experiência escolar negativa e que abandonaram precocemente o sistema de educação e formação, emerge assim da consciência de que é necessário proporcionar a estes jovens uma abordagem alternativa à dos sistemas regulares, que permita reconstruir com cada um/a uma proposta de formação específica e ajustada aos seus interesses, capacidades e expectativas, criando condições para a inversão de trajetos anunciados de exclusão social. Não se trata de um regresso às salas de aula tradicionais, mas antes de uma nova experiência educativa num modelo de educação e formação diferente.
Estudos recentes realizados junto de alunos, professores e técnicos de projetos de Educação de Segunda Oportunidade têm permitido identificar diversas práticas educativas positivas e promotoras da aprendizagem e do desenvolvimento dos jovens, especialmente daqueles em situações de maior vulnerabilidade ou marginalidade. Entre elas podem salientar-se:
· as relações de proximidade e de suporte estabelecidas entre jovens e adultos;
· a aceitação incondicional dos/as alunos/as;
· a valorização das suas competências e experiências;
· o estabelecimento de planos educativos personalizados;
· a utilização de métodos pedagógicos ativos e expressivos, especialmente de caráter vocacional ou artístico;
· uma gestão participada pelos/as alunos/as e a articulação com diversos atores institucionais e organizações da comunidade.
Embora pouco reconhecida em Portugal, a Educação de Segunda Oportunidade está amplamente difundida noutros países europeus e tem revelado incontornáveis benefícios para os/as jovens em situação de abandono escolar. O seu modelo e práticas educativas podem também inspirar, com as necessárias adaptações, inovações e melhorias nos sistemas de ensino regular com vista ao reforço da prevenção do insucesso e do abandono escolar.
Por Isabel Castro e Filipe Martins (Faculdade de Educação e Psicologia da Universidade Católica Portuguesa)