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    Porque está aí, outra vez, o Dia Mundial da Poesia

    Porque está aí, outra vez, o Dia Mundial da Poesia

    3/15/2021

    A poesia tem em si um lado estranho e obscuro, mesmo quando parece emanar dela uma grande claridade. Isso faz com que não seja fácil dizer o que a poesia é.

    A propósito, ocorre-me uma composição muito breve do poeta brasileiro Paulo Leminski (1944-1989) que diz assim:

     

    um poema

    que não se entende

    é digno de nota

     

    a dignidade suprema

    de um navio

    perdendo a rota

     

    Por isto, acho eu, gosto muito de ler e reler alguns poemas que tenho a sensação de não entender bem. E até gosto de alguns assumidamente absurdos e de outros, por exemplo de Lewis Carroll e de Manuel António Pina, que foram escritos com palavras inventadas.

    Mas interrogo-me ainda: porque será a poesia tão essencial, tão necessária a tanta gente? E só consigo responder com perguntas:

     

    Será a poesia o produto de um olhar atento ao real, tão atento que se revela único?

    Será voz do humano ou do inumano?

    Será, em alguns poemas, uma espécie de formulação inaugural de certa verdade sobre o mundo?

    Será inquietação que não cessa? Ou refúgio e lenitivo?

    Será um regresso à infância do ver e do dizer?

    Será aquela inutilidade cujo caráter gratuito se revela da maior utilidade?

    Será o modo mais claro, simples e justo de dizer alguma coisa e, noutros momentos, o modo mais obscuro e indefinido?

    Será como um sofisticado mecanismo de relojoaria ou será, antes, grito e excesso?

    Será ordem absoluta ou será jogo?

    Será insubmissão e rebeldia, ou contemplação e conquista da suprema serenidade (“serenidade és minha”, escrevia o poeta Raul de Carvalho)?

    Será uma forma de religação aos outros e de aguda compreensão do tempo em que o poeta vive? Mas, noutros casos, não será a poesia uma ilha?

    Será linguagem provocadora duma estranheza iluminante?

    Será a poesia tudo isto em forma de música de palavras?

    Será uma forma de resgatar a palavra, de a salvar de um rio de impurezas?

    E, já agora, será que a poesia só existe em palavras? Ou haverá também poesia na música, na dança, na pintura e no desenho, na escultura, na arquitetura, na moda? E o que será isso da poesia da natureza? E a poesia do quotidiano e das relações humanas?

    Pedindo emprestada a Pessoa a expressão sobre o mito, a poesia será o nada que é tudo?

     

    Termino, ao chegar este Dia Mundial da Poesia, com um poema recente, um haicai sobre uma libelinha (será?), que compus à concisa maneira japonesa:

     

    Aprender na vida,

    talvez, com o viver sobre a água

    desta libelinha.

     

    João Pedro Mésseder

     

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